Nota Solta #62 — Retrospetiva de Março ‘25
Dizem que as melhores ideias surgem durante o banho…
…mas é também durante o banho que me recordo de coisas que já deveria ter feito. Como, por exemplo, escrever sobre o mês de março. Lembrei-me, simplesmente, que deixei passar esta reflexão que poderia ter saído na semana em que não partilhei nada por aqui. Tenho vindo a notar que após algum período de tempo, há sempre uma semana em que descanso, não publicando nada na newsletter. Ao contrário do que já se sucedeu, não me cobro incessantemente, reconhecendo que, por vezes, não há nada para dizer. E mesmo que haja, sejamos sinceros, nem sempre temos de as dizer.
Respeitando esse fluxo, vou tendo monólogos comigo mesma, anotando temas acerca dos quais quero escrever, ainda que os dias se passem e eu deixe que uma ansiedade me assombre, revelando que fui feita para expulsar e não interiorizar. A criatividade, o ato de criar algo só porque sim, não importa se os termino ou não, é o que me dá fôlego. E, em março, dei-me conta que tenho estado mais cansada do que nunca por aceitar que todo este peso habite em mim, sem pô-lo cá para fora. Preciso de criar, é urgente criar, parece uma loucura, mas a minha vida depende disso. A minha saúde mental precisa disso.
Compreendo melhor por que razão é que o processo da dissertação tem sido tão complicado. Por não me dar ao luxo de me entregar aos meus hobbies, o receio de estar a “perder tempo” que poderia ser utilizado para a pesquisa, é que me envolvo com uma bola de neve gigante que derruba não só as coisas más como as boas. É muito chato que assim seja. Há alturas em que observo todo este acontecimento sentindo-me impotente para agir, outras em que reajo sem sequer meditar sobre as estratégias mais adequadas. Não quero reagir, quero agir em relação ao que a vida me põe à frente - assim como ao que faço dela -.
Março foi um mês de alguns recomeços. Recomecei a ser acompanhada por uma nutricionista, após anos a sentir ranço das experiências de tive com outras da área. Recomecei, aos poucos, a organizar algumas ideias para a dissertação (ter marcado uma reunião com os meus orientadores depois de três meses já diz muita coisa). Recomecei a tirar fotos ao espelho num manifesto de auto-compaixão pelo reflexo que vejo, não obstante a (ainda) necessidade de apontar tudo o que considere estar mal. Recomecei as caminhadas junto ao rio. Recomecei a ler mais desde que comprei um kobo.
Em paralelo, também foi um mês de juntar todas as pessoas que amo numa só mesa, colhendo a sensação de estar a viver um sonho. E estou, se considerarmos que sonhos realizados não deixam de ser sonhos. No meio de tantas responsabilidades adultas, a mais chata foi ter descoberto que o carro precisa de alguns arranjos que coincidirão com o mês da inspeção e do IUC. Como é bom ser adulto, não é? Ainda que tenha uma relação de amor-ódio com o meu Fiat Punto ‘98 Sports de 16 válvulas e que apelidei de Speedy pela sua incapacidade de atingir os 100km/h sem se começar a desfazer, é um objeto ao qual dou bastante valor não só por ser o meu primeiro carro da vida adulta, como por me ter sido oferecido por uma tia bastante querida e que me havia prometido que, na eventualidade, este carro seria meu.
No entanto, a cada mês que passa, o desejo de trocá-lo por outro suscita sentimentos igualmente desconfortáveis. Sentimentos como uma ansiedade de avançar logo para o momento da troca, mas que implica uma organização financeira que só pus em prática duas ou três vezes ao longo da vida. Além da ansiedade, é em momentos como este que reconheço que o meu ponto de partida não foi igual ao de muitas pessoas à minha volta, como tal, existe ainda alguma dificuldade em ter mais na conta bancária após pôr as despesas do mês em dia. Nesse hiato, desejar por melhores condições salariais nunca foi tão forte como agora, despertando ainda mais o desejo de ir para o estrangeiro e, por alguns anos, trabalhar com o foco de melhorar a minha situação financeira.
A troca de um simples carro está a pôr em causa tudo aquilo em que acredito (ou condeno) sobre o nosso sistema social, as minhas responsabilidades, a rotina que almejo, as pessoas que devo estimar (ou deixar ir), as minhas prioridades, e assim por diante. Em suma, estou a perceber na prática o que há muito conhecia na teoria: a vida de adulto é, por vezes, uma grande pedra no sapato. Obrigada, Speedy, por reforçares a minha consciência de classe.
Antes que esta retrospetiva fique ainda mais deprimente, vamos avançar para outros detalhes do mês de março.
▬ Leitura do mês
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Uma das rubricas que quero começar nesta newsletter é sobre os livros mais estranhos que já li. Ainda que de forma preliminar, a primeira etapa foi a de pesquisar histórias que aparentam ser estranhas, confirmando-as ao longo da leitura. Comecei com o “Cursed Bunny”, da autora sul-coreana Bora Chung. Os capítulos, sem correlação nenhuma, estão divididos por conto, cada um mais estranho do que outro. Dois ou três foram realmente bizarros, não obstante a ousadia da autora que me convidava a querer ler mais e mais.
Agora que penso no assunto, cada conto traz-nos uma lição de moral sobre cada tema abordado (maternidade, capitalismo, ganância, solidão, etc.), um convite para a reflexão que aparenta estar cada vez mais perdida nesta sociedade abismalmente mais auto-centrada e menos pensadora. Ainda bem que os livros existem para tal. Não gostei de todos os contos, mas fica a sugestão pelo facto da proposta de “Cursed Bunny” enquadrar-se na rubrica que pretendo desenvolver nas próximas semanas.
▬ Áudio do mês
Ouvi muitas coisas em março, porém, nada que possa destacar nesta retrospetiva.
▬ Artigo mais lido do mês…
As minhas recomendações das newsletters que li no Substack há umas quantas semanas. Mais edições estão por vir!
▬ …mas o que mais gostei de escrever foi…
Um dos meus momentos favoritos no trabalho é o de poder apontar alguns pensamentos soltos no journal quando as tarefas do dia se tornam escassas. Assim como acontece com a secção do áudio do mês, não há nada de muito particular que consiga destacar das frases que compus em março. No entanto, sei que me faz bem transferir certas preocupações para o papel, podendo relê-las para as solucionar com mais calma.
▬ Uma conquista (dentro ou fora das metas’25)
Poder ser acompanhada por uma nutricionista com a qual me sinto confortável. Fui acompanhada por algumas nutricionistas ao longo da adolescência e tenho a dizer que não aprendi grande coisa com nenhuma delas. Como consequência, fiquei com a ideia de que ser acompanhada não me ajudaria em nada, tornando-me um tanto obcecada com a pesquisa de conteúdo sobre alimentação e hábitos alimentares. O resultado? Não só sentir-me sobrecarregada como nunca ter aprendido, verdadeiramente, a encarar a comida como uma aliada para a saúde a longo prazo e não como uma inimiga.
Aos poucos, vou reintroduzindo alimentos e estratégias que, por muito tempo, achei que fossem um perigo, percebendo que não o são. Ter de registar tudo por fotografia é também um máximo, pois além de ser uma pessoa bastante visual, é interessante acompanhar quando é que sinto resistência a registar um prato/snack/exagero, sendo que não fazê-lo para “parecer bem” aos olhos da nutricionista que me acompanha seria, na verdade, enganar-me a mim mesma. Este processo, portanto, está a ajudar-me a ser honesta com as minhas escolhas, abraçando-as sem medo nem cobranças (que se vão manifestando, mas faz parte do processo).
▬ 1 fotografia
Depois de muito tempo sem publicar fotos minhas no instagram, eis que me senti extremamente bela no dia 8 de março. Adoro este outfit em particular (aqueles crocs rosa que uso em casa dão-lhe outro charme), então quando meto um batom vermelho, sinto-me capaz de tudo. Até de partilhar fotos minhas quando não me sinto, de todo, bonita. O que vale é que se trata apenas de uma fase. Tal como qualquer outra, vai passar.
▬ 1 aprendizagem
Fazendo referência à conquista de março (que coincide, na verdade, com a primeira semana de abril), reaprender a comer não precisa de ser um processo moroso. Pelo contrário, há forma de me divertir enquanto faço uma reeducação alimentar.
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Até breve,
Carolayne 💫
Que partilha bonita 😊 há um ano que comecei a minha jornada de reeducação alimentar. Comecei por introduzir alimentos e depois passei para substituir coisas que gosto, que sejam igualmente boas (de sabor) mas saudáveis. Foi das melhores coisa que fiz por mim.
Boa sorte na tua jornada!